terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Centro XXXII


Desta vez vemos o que talvez seja o prédio, ainda de pé, com a azulejaria mais complexa do Rio de Janeiro. Parace mesmo que estamos frente a um pequeno mostruário de azulejos holandeses!
Na Lapa já houve um imóvel com uso similar de vários padrões de azulejos misturados em uma única fachada, que pode ser visto neste link, mas que infelizmente teve sua fachada cruelmente destruída, segundo Raul Félix, entre os meses de março e abril de 2008.


Este imóvel tem ainda uma outra particularidade, coisa rara nas construções desta época (séc. XIX). Ele pode ser visto, pelos fundos, pois o imóvel construído no lote aos fundos deste é baixo. E a fachada dos fundos também recebeu azulejos!


E a fachada dos fundos possui uma coluna a mais de janelas que a fachada frontal, e o curioso foi terem azulejado esta parte adicional com padrões diferentes de um lado, com três janelas, que basicamente segue o mesmo padrão da fachada frontal. É como se por trás víssemos dois prédios independentes, porém geminados.

A atual Praça Tiradentes teve origem, nos idos do Séc. XVII, no desmembramento do então chamado Campo de São Domingos. Em 1690 chamava-se Rossio Grande, em clara alusão ao Largo do Rossio lisboeta; mais tarde, passou a Campo dos Ciganos, devido à chegada, de Portugal, de um grupo desses nômades, e que ali montaram, por algum tempo, suas barracas. A partir de 1747, com a construção da Capela de NªSª da Lampadosa, passou a ser conhecida como Campo da Lampadosa. Em 1808, passou a ser o Campo do Polé, graças à instalação, no local, de um pelourinho.

O Rossio e o Real Teatro São João, onde Debret, autor deste quadro, trabalhou como cenógrafo.

Em 1821, passou a ser chamada Praça da Constituição; D. Pedro, assumindo o posto de Príncipe Regente, jurou fidelidade à Constituição Portuguesa de uma das varandas do Real Teatro São João que ficava onde, hoje, encontra-se o Teatro João Caetano. Finalmente, em 1890, ao aproximar-se o centenário da morte de Joaquim José da Silva Xavier, passou a ter o nome de Praça Tiradentes, pela proximidade do local onde se acredita ter sido enforcado o protomártir da Independência.


No centro da praça, o monumento a Pedro I, mandado erigir por Pedro II, foi inaugurado em 1862. Apresenta o Imperador a cavalo, fardado de general, segurando com a mão esquerda as rédeas, enquanto com a direita exibe a Constituição de 1824.(Há quem acredite tratar-se das cartas recebidas às margens do Ipiranga.) No pedestal, quatro estátuas de bronze representam os rios Amazonas, Paraná, São Francisco e Madeira. O monumento nasceu de um concurso internacional, em 1855, vencido pelo brasileiro Maximiliano Mafra, e foi construído em Paris por Louis Rochet (3º colocado no mesmo concurso) que tinha como aprendiz o jovem Auguste Rodin.





Em 1865 acrescentaram-lhe quatro alegorias representando as virtudes das nações modernas: a Justiça, a Liberdade, a União, e a Fidelidade, depois transferidas para a Praça NªSª da Paz, em Ipanema. O gradil foi instalado em 1865. O monumento foi recentemente restaurado (2006) e as alegorias retornaram, devolvidas à Praça. (fonte: http://oriodeantigamente.blogspot.com.br/2011/01/praca-tiradente.html)


Esta postagem vai ter um certo excesso de fotos, mas como dar conta da loucura que foi o uso de azulejso neste imóvel? Muitos dos azulejos que vemos aqui já apareceram em postagens anteriores, alguns, porém, é a primeira vez.

pequenos grupos:






detalhes dos azulejos:


O padrão "Marmer" (mármore) acima, também conhecido como "Marmerde" (marmoreado), "Albast" e "Albasterde" (alabastro), segundo o livro "De Nederlandse Tegel / The Dutch Tile", de Jan Pluis (a maior "bíblia" no assunto), foi produzido com muitas variações entre 1780 e 1930, na região de Harlingen, Makkum e Utrecht, Países Baixos. 



prancha com o modelo de decoração "Krullen" (curvas), do livro de modelos de pintura de azulejos,
doado ao arquivo municipal em 1876 de Roterdam por Frederick James Kleijn (1819-1881), proprietário de uma fábrica de azulejos naquela cidade.

exemplar de azulejo com decoração "Krullen" do acervo do Museu Holandês do Azulejo.
Segundo o catálogo deste museu, esta decoração foi usada de 1750 a 1850, tanto na Holanda
como na Frísia, província independente ao norte dos Países Baixos.


close-up de um dos conjuntos de azulejos presentes no imóvel
que formam uma "rosa dos ventos"


exemplar de azulejo com decoração "Kwartster" (quarto de estrela) do acervo do
Museu Holandês do Azulejo. Segundo o catálogo deste museu, esta decoração foi
usada de 1800 a 1870 na Frísia, província independente ao norte dos Países Baixos.

foto de azulejo de um catálogo online de azulejos antigos holandeses.
reparem como o modelo frísio (acima) é bem mais parecido com os
azulejos usados neste imóvel do que o modelo holandês.


foto de azulejos de um catálogo online de azulejos antigos holandeses.

prancha com o modelo de decoração "Jeruzalemsveren" (Penas de Jerusalém), do livro de modelos de
pintura de azulejos, doado ao arquivo municipal em 1876 de Roterdam por Frederick James Kleijn
(1819-1881),  proprietário de uma fábrica de azulejos naquela cidade.


foto de azulejos de um catálogo online de azulejos antigos
holandeses, modelo "Kettingrand".

foto de azulejo de um catálogo online de azulejos antigos holandeses.
Em outro catálogo, este padrão se chama "Klokjes",  e teria sido fabricado entre 1860 - 1900:
 





prancha com o modelo de decoração "Dubbel kruisblad" (cruz com lâmina dupla), do livro de
modelos de pintura de azulejos, doado ao arquivo municipal em 1876 de Roterdam por
Frederick James Kleijn (1819-1881),  proprietário de uma fábrica de azulejos naquela cidade.




prancha com o modelo de decoração "Beugeltassen", do livro de modelos de
pintura de azulejos, doado ao arquivo municipal em 1876 de Roterdam por Frederick James Kleijn
(1819-1881),  proprietário de uma fábrica de azulejos naquela cidade.


5 comentários:

  1. Para que fique registrado nos autos, esclareço que o Crime da Rua Matacavalos ocorreu entre os meses de março e abril de 2008. Faço sempre as compras no supermercado que fica diante dele, mas desta vez, eu estava de férias. Fui ao Atacama e quando voltei a fachada do casarão estava deserta.

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  2. Fiquei encantado com esta amostragem e a quantidade de fotos.
    Sempre ouvi falar desta praça, que não conheço, apesar de já ter estado em Tiradentes, que é um local perfeitamente encantador.
    Gostei imenso de ter visto a gravura de Debret, onde a fachada do Real Teatro de S. João tem grande afinidade com a de S. Carlos, aqui em Lisboa.
    Este edifício em particular que apresentas deve ter constituído um prazer para o dono.
    O azulejo com o desenho da estrela parece-se muito com um portuguesíssimo afim, do século XVIII, e bastante comum nas edificações do período, só que o modelo português
    é executado de forma mais livre e menos rigorosa, mas, talvez por isso, seja tão encantador! Tenho umas três dúzias deles e ando a estudar o melhor local para os encastrar na parede.
    A célebre bicha-da-praça e a banda de azulejo onde se vê um enrolamento também aparece em vários edifícios portugueses, se bem que o modelo do século XIX português é executado de forma mais elaborada que este que aqui apresentas.
    Vou aprendendo mais e perguntando-me se os nossos foram inspirados pelos holandeses ... ou se terá sido o contrário. Seja lá como for, é uma sorte tê-los e, de preferência, mantê-los.
    Um bom ano e espero que ele te traga para o nosso convívio, ainda que por pouco tempo
    Manel

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    1. Olá Manel,
      Eu fiz questão de apresentar bem a Praça Tiradentes, antigo "largo do Rossio" justamente por ela ter tantas afinidades com o Rossio de Lisboa, e mesmo outras praças em tua cidade.
      Quando você cita o azulejo de estrela, você fala do marrom, que parece uma rosa dos ventos?
      Uma coisa que fiquei pensando sobre este prédio, ainda mais por causa desta mistura de padrões, é que muitos, mas muitos azulejos parecem ter as bordas lascadas, tanto nas fotos acima, e em outras que não publiquei. Será que este prédio não poderia ter sido revestido por azulejos recuperados das muitas demolições realizadas na primeira metade do século XX?
      Andei comparando com as fotos de outros imóveis no Rio, que mesmo estando em estado de calamidade, não apresentam tantos azulejos com as bordas lascadas. Acho que é uma hipótese que precisa ser contemplada.
      abraços!

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    2. faltou dizer: concordo contigo: a forma mais livre da decoração dos azulejos portugueses também me encanta, pois na variação e nnos pequenos erros, percebemos o elemento humano.
      Os azulejos holandeses são lindos, eu adoro que ainda estejam por aqui, e isto até nos permite comparações e teorias, mas certamente são mais rígidos, menos lúdicos.
      Por outro lado, há padrões exclusivamente holandeses, como o "Beugeltassen" ou o "Dubbel kruisblad" que formam conjuntos interessantíssimos, muito originais, e bastante característico de um design dos países baixos.

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